Esta semana observei três crianças, de idades diferentes, brincando
com um jogo de tabuleiro chamado Jogo da Vida. Eu não conhecia o jogo. Elas
estavam na sala e eu na cozinha, à mesa, tentando pela milésima vez usar a
internet do celular. Enquanto esperava carregar alguma página, passei a prestar
atenção na conversa das meninas. Uma delas pegou uma carta e leu: “você tem que estudar para o vestibular,
fique uma rodada sem jogar”. Eu me lembro de pensar em como aquela sentença
realmente fazia sentido. Geralmente, o jovem que está se preparando para o
vestibular, praticamente deixa de viver por um período. É claro que estou
falando dos que estão realmente interessados em passar no vestibular, e também
estou falando de uma das boas universidades públicas do Brasil, porque quando
se trata de faculdade particular, não há tanta necessidade de estudar, com
raras exceções.
Enquanto eu ainda pensava sobre o coitado do estudante que “perde a
vida” na esperança de que, com um diploma embaixo do braço possa “ganhar a vida”,
as crianças começaram a brigar, não faço ideia do por que. Mas é claro que, com
criança, o motivo pode ser qualquer um. Já era, talvez, a terceira briga que
elas estavam tendo desde que o jogo começou, quando a irmã mais velha
interrompeu a confusão, impondo ordem ao caos. O que me chamou a atenção naquela
cena foi a frase que a irmã mais velha utilizou para chamar a atenção das
meninas: “vocês mais brigam o que jogam”,
ela disse. E não é que mais uma vez se parece muito com a Vida Real?! Nós
gastamos boa parte das nossas “brigas vidando” ao invés de viver. Brigamos com
nossos pais, irmãos, colegas de escola, brigamos no trânsito, no trabalho, com
quem amamos, também com quem odiamos. É, há quem odeie. Brigamos com a
atendente da operadora de telefone, da internet, brigamos com a balança, com a
conta bancária, enfim, brigamos por tudo e com todos. Mas será que não estamos nos
esquecendo de uma coisinha chamada vida no processo?
Eu não sei quem é o vencedor no jogo de tabuleiro chamado Jogo da
Vida, mas na Vida que eu jogo ninguém ganha, ninguém perde. Todas as coisas
acontecem a todos, as boas e as ruins.
Nesse jogo, alguns meninos pobres tornam-se jogadores de futebol milionários,
outros se tornam traficantes e morrem jovens ou são presos. Alguns meninos
ricos tornam-se PlayBoys violentos capazes de colocar fogo em moradores de rua,
enquanto outros tornam-se pessoas que fazem o bem para muitos. Os tetos também caem,
tanto sobre ateus como sobre cristãos. Sim, não há vencedores nem perdedores,
apenas uma multidão de indivíduos que, em sua maioria, não sabem que são
indivíduos e comportam-se sempre como multidão. Cada um e une ao seu grupo e se
acha melhor que o outro grupo. Ou, o indivíduo que pertence a um grupo, deseja
pertencer a outro, porque o julga melhor. Mas raramente este indivíduo escolhe
pensar por si mesmo e seguir o seu próprio caminho.